Os olhos de minha alma percorreram os cômodos vazios e manchados pelas lágrimas do tempo que infiltradas nas paredes emprestam um ar triste ao prédio abandonado.
Os passos daqueles que chegam denunciam a alegria incontida no coração dos Irmãos do Núcleo Espírita Nosso Lar. Pela primeira vez percorrem os corredores do tão sonhado hospital espírita que passou do sonho para a realidade. Sugestões, projetos e uma imensa boa vontade para angariar recursos capazes de por em funcionamento o prédio recém adquirido. Em tempo menor que o esperado, paredes inacabadas são erguidas, enquanto o telhado é reparado e concluído. As paredes finalmente recebem a tinta fresca que dá o último toque nas dependências do CENTRO DE APOIO AO PACIENTE COM CÂNCER – o nosso CAPC.
O prédio adquirido que foi parcialmente erguido por entidade que professa a mesma fé que a nossa tinha como objetivo abrigar menores abandonados. Ainda que esteja escrito nas estrelas que também teremos um lar para essas crianças abandonadas, primeiramente era necessário volver nossos olhos para aqueles que lutam pela vida e contra o câncer. Era preciso aplacar a dor daqueles que se acham feridos no corpo e na alma.
Quantas vezes percorri aqueles corredores iluminados pela lua cheia que espiava-me através das vidraças nuas as quais aguardavam os recursos financeiros e doações para vestirem-se com suas esperadas cortinas. Em minha habitual solidão fui fazendo o rol de nomes daqueles obreiros que seriam chamados para o exercício pleno da caridade. Especialmente chamados, um a um. Assim, amorosamente passei a chamar desde o mais humilde servidor ao mais capacitado doutor. Cada um exerceria sua função segundo sua qualificação e graduação na escola da vida. Os diplomas terrenos eram diferentes entre si, mas os diplomas espirituais eram todos iguais: irmãos diplomados no amor e na caridade cristã.
Ah! O primeiro dia em que as portas do CAPC se abriram ainda guardo na lembrança… Os anjos de branco, como são chamados pelos pacientes nossos trabalhadores voluntários, irradiavam o sorriso que Jesus emprestou a cada um em dia tão especial. Os corpos dos pacientes alquebrados pela dor e pelo sofrimento passaram a ser gentilmente encaminhados para os brancos leitos que amorosamente foram preparados para cada um deles. Já eram tão esperados!
Nossos médiuns e colaboradores voluntários, homens e mulheres de boa vontade passaram a circular pelo Centro de Apoio ao Paciente Com Câncer e tornaram-se expert´s na arte de amar e de curar. Esquecendo-se de si próprios e de seus próprios problemas fizeram-se felizes ao curar as almas daqueles que tinham o corpo doente. A cura da alma é o primeiro passo para a cura do corpo físico. E isso é especialmente trabalhado em nosso CAPC.
Nosso paciente com câncer trocou a máscara da dor pelo pálido sorriso ao ver chegar às sete horas da manhã o irmão obreiro tocando violão para acordá-lo do sono de uma noite bem dormida após a cirurgia espiritual. E antes de voltar ao aconchego familiar cantou conosco e brincou de Karaoque. Chegou alquebrado com a dor e saiu com a disposição de quem voltou a dizer “sim” a vida. A chama da vida se acendeu em seus olhos e quase não foi reconhecido pelos seus entes-queridos. Milagre? Sim… O amor é um milagre… Semeamos amor, o amor de Deus, por onde passamos, atentos as lições do Mestre Jesus para o processo de cura interior que possibilita a recuperação do corpo físico.
Pelos dedos de nossos obreiros Deus toca um a um os pacientes. Através da mão que se estende sobre a cabeça do doente, Deus derrama suas bênçãos. Existe função mais nobre do que essa?
Aqui estou, pois, após mais uma semana de trabalhos nesta Casa de Amor e Caridade. O último trabalhador fechou a porta, encerrando também os trabalhos de uma semana em que estivemos em combate contra o sofrimento. Só, percorro mais uma vez os corredores, subindo as escadas e rampas que levam aos andares superiores. Meus olhos se detêm em cada quarto e em cada leito. Lembro cada rosto, cada olhar agradecido e a história de cada um. Missão cumprida também nesta semana que se encerra. É o amor operando milagres. Releio os nomes no Caderno do Tempo e vejo quantos pacientes já obtiveram a cura dentro dessas paredes. Soam ainda no auditório os acordes da Ave Maria . A energia gerada pela Fé continua a impregnar o ambiente.
Desço vagarosamente as escadas que me levam a pequena Capela onde se reúnem os Médiuns e voluntários em cada começo e final dos trabalhos. O silêncio é intenso na madrugada fria. Ele se instala em meu aquecido coração enquanto repasso na memória o rosto de cada dedicado trabalhador. Às vezes me ponho a pensar se esses dedicados irmãos sabem, se já avaliaram e se já perceberam o esforço empreendido e a conotação junto à Espiritualidade de seus gestos.
É nesse silêncio, nessa paz que me envolve que sinto o perfume das delicadas flores plasmadas no astral, cujas pétalas caem docemente sobre o nosso CAPC. São dádivas Daquele que ensinou como se deve rezar ao Pai. A melodia do Rancho de Amor à Ilha nasce no violino que ouço ao longe. É o hino à cidade que um dia se chamou Desterro, a minha Desterro.
É hora de visitar cada trabalhador em seu lar para colocar sobre a testa de cada um, meu ósculo de emocionado agradecimento. É hora de fazer minha visita médica a cada paciente que esteve hoje em nossa Casa.
Com amor,
Irmão Savas
(Mentor do Núcleo Espírita Nosso Lar)