Aqui estamos mais uma vez, meu bom irmão, nesta informal reunião de almas onde procuramos estudar nossos comportamentos para vencer aqueles defeitos que impedem nossa felicidade.
Hoje preciso te falar sobre o lado feio do amor. Ora, dirás, como podes dizer que o amor tem um lado feio? Tens razão, irmão! O amor jamais poderá ter um lado feio, pois, se assim fosse deixaria de ser amor para ser medo. E o medo é totalmente contrário a força do amor. Ou seja, dois sentimentos antagônicos que governam o mundo.
Embora não exista o lado feio do amor, direi que existe o lado feio do sentimento que erroneamente é entendido como amor e que em verdade trata-se de mera paixão em nome da qual se pratica toda a sorte de desejos egoístas.
Enquanto o amor edifica, eleva espiritualmente, torna as pessoas mais humanas e melhores, a paixão mal direcionada, rebaixa, vulgariza, aprisiona, transformando as pessoas em seres brutalizados, egoístas e até maus. Portanto, é preciso compreender o que é a paixão. Paixão e amor não se confundem, diferem em seu objeto de desejo, são muito distantes em suas motivações.
Não somos contra a paixão, pois, ela, quando emoção benfazeja é necessária para aquecer e iluminar o amor. Todavia, a paixão, se não for bem conduzida, leva o apaixonado a se tornar “proprietário” de alguém. Esse possuidor à base de força não visa a felicidade do outro e sim a realização de seus desejos materiais e reforço de seu ego. Não ama e não se sente amado e por isso torna-se amargo, controlador e finalmente, agressivo. Passa a exigir amor, e a vigiar o outro, inclusive com pretensão de ser dono de seus pensamentos. A convivência a dois torna-se desagradável, pois não existe mais prazer na companhia um do outro. É o sentimento de posse que transforma o olhar terno no olhar duro e raivoso, que provoca a agressão e que por vezes causa a morte.
A paixão descontrolada quando passa a ser gerida, administrada pela raiva e pela mágoa, assusta aquele que é visado pelo apaixonado. A ternura é substituída pelo rancor e os gestos comuns naqueles que realmente amam são trocados pela agressão da palavra que fere e mortifica quando não passa da palavra ao ato que causa danos físicos.
Que amor é esse que faz chantagem, que fere e que mata? Não é amor, meu irmão. É ciúme. É o chamado amor feio, o amor doente.
Ah! O ciúme! Todos nós sentimos ciúme de algo ou de alguém. Uma pitadinha de ciúme é até saudável no relacionamento a dois. É o toque de zelo, o toque que mantém o lustre do amor. Tudo na vida tem seu ponto de equilíbrio. Nem de mais e nem de menos é a forma saudável de tudo. O ciúme excessivo é nocivo. O ciúme doentio já protagonizou grandes tragédias, tanto na ficção, quanto na vida real. Em nossos dias os crimes chamados passionais são cometidos por pessoas que estão dominadas pela emoção, sem condições normais de raciocínio. Assim, o ciúme é um sentimento que merece ser tratado com atenção e cuidado. Nele se encontra, muitas vezes, uma essência patológica causada pela auto-rejeição por não se sentir digno, bom o bastante para ser amado.
Na realidade quem assim age, ama, tão somente, a si próprio. É o chamado amor egoísta que visa unicamente o bem estar próprio. E como sabemos, precisamos amar para receber amor. Como amar uma pessoa que fere, agride, ameaça e chantageia? Como amar alguém com os olhos cheios de raiva, refletindo uma alma dura e sem piedade? Como beber da fonte do amor com alguém que está cheio do veneno emocional? No amor existe certificado de garantia, garantia essa de durar uma vida inteira. Na paixão, contudo, o prazo de validade expira e o produto estraga passando a cheirar mal. E é aí que o consumidor se revolta e passa a punir, a castigar, a ameaçar e fazer chantagem com a vítima do suposto amor.
Quanta maldade em nome do amor, daquele mesmo amor que emana da Fonte Pura e mata a sede da alma! Como já mencionamos, os pensamentos e atos humanos são originários de dois sentimentos distintos, quais sejam, o amor e o medo. Assim, o ciúme é produto do medo. Medo de não ser bom o suficiente para ser amado por outra pessoa. Medo de que o outro lhe abandone, medo de ficar só, medo de perder a parada e ficar com o orgulho e o amor próprio ferido. Essas são algumas das faces do medo em forma de ciúme, mas, existem centenas de outras faces, todas elas igualmente feias e rancorosas.
O medo faz com que as pessoas usem máscaras e mantenham seus corpos com roupas pesadas e impróprias, O amor desnuda seus rostos e corpos permitindo-lhes que a luz do sol higienize diariamente o receptáculo dos sentimentos. O medo lhes faz aprisionar e ser prisioneiros de si próprios, enquanto o amor liberta o ser amado para que seu riso e felicidade aflorem ao percorrer os campos em sua liberdade. É gratificante estar com alguém espontaneamente, estar com alguém por querer estar e não quando se tem que estar com alguém por imposição, para exercer o controle. Que se espera de um relacionamento desses? Que gosto amargo deve sentir na alma uma pessoa que egoisticamente prende alguém ao seu lado esperando com isso ser feliz!
Não fale em amor, meu irmão, se vivencias o medo de amar causado pela tua auto-rejeição. Não fale de amor se humilhas o amado com tua arrogância, com tua raiva, e orgulho exacerbado. O amor é alegria, é ternura, é bondade, é querer ver o outro feliz ainda que não lhe seja possível partilhar dessa felicidade. Enquanto não caminhares na direção do outro para te tornares um só, não podes falar de amor. Enquanto não sentires uma ternura imensa pelos erros e defeitos daquele que dizes amar, eu te direi que ainda não lhe amas. Enquanto não fizeres do amor uma escrita de Deus, nada conheces sobre amar.
Precisamos aprender a nos amar para então amar mais e melhor.
Com amor,
Irmão Savas