O céu com nuances cor de rosa anunciavam um calor abrasador naquele dia recém nascido. Olhei por uma fração de segundos para minhas mãos tão maltratadas que um dia tiveram a pele quase sedosa. Lembranças…
Fazia minha primeira refeição, antes de começar meu trabalho no canavial dourado pelos raios de sol. Meus olhos que acompanhavam a dança do canavial causada pelo vento brejeiro atravessaram os montes e pousaram no mar, no mesmo mar que beijavam as areias da minha terra distante. E meus olhos deixaram cair as lágrimas que a saudade fabrica.
Um homem alquebrado pelo serviço pesado sentou-se ao meu lado e logo veio outro e mais outro para o discreto ritual de todos os dias. Era a hora em que dávamos graças à Deus pelo pedaço de pão que comíamos, pelo dia banhado de sol, pelo trabalho humilde e sofrido que traria a comida à nossa mesa. Terminada a prece que eu mesmo dirigia, tínhamos alguns minutos para a conversa diária antes de dar início ao trabalho tão árduo que nos aguardava. Por eu ter instrução, saber falar, aconselhar, fazer curativos quando se machucavam, tornei-me, para aqueles pobres homens desvalidos da sorte, um professor, um amigo, um pai, um irmão, um sacerdote, e especialmente, um médico de almas.
Com aqueles pobres e queridos homens comecei a aprender e a ensinar a superar as dificuldades que a vida nos apresenta. Enxuguei lágrimas que se misturaram as minhas, segurei mãos de moribundos e afaguei crianças recém nascidas. Aprendi a amar meus semelhantes e abrandei minha própria dor. E assim foi até o final de meus dias.
Hoje, sob minha responsabilidade espiritual tenho outros trabalhadores. Eu os vejo subindo e descendo escadas, ajeitando travesseiros, amparando corpos, suavizando dores com suas mãos de luz. Acompanho com os olhos as pequenas e delicadas mãos e as mãos grandes e vigorosas no trabalho desenvolvido pelo Núcleo e CAPC.
Quantas vezes, meu irmão, vi teus passos ligeiros descendo a rampa, empurrando uma maca, segurando o braço do paciente, ou ajeitando tua roupa e cobrindo teus cabelos para adentrar na sala onde são realizadas as cirurgias espirituais.
Ah! Se pudesses ver, meu irmão, a nível espiritual o que ocorre na “Operacional” como é chamada a sala de cirurgias, haverias de verter grossas lágrimas nascidas da emoção. A luz que irradia dentro daquelas paredes, se teus olhos pudessem perceber, eles seriam fechados por não ter condições de mantê-los abertos diante de grandiosa radiância energética que paira no ambiente.
Das tuas mãos impostas sobre o paciente flui com abundância o magnetismo superior da Poderosa Espiritualidade. É através de teus braços e das tuas mãos que é canalizada a luz que cura. De ti para o paciente flui um filete luminoso que canaliza a energia vinda do éter. Corações unidos pela fé. É uma hora de tão grande magnitude, de tão sublime respeito que se fosse possível, até as respirações seriam suspensas para a que o fluxo energético não recebesse qualquer interferência.
Bem por isso, venho te pedir amado irmão, seja qual for o serviço que executas nas áreas operacionais, faça-o em profundo silêncio e com reverente ternura. Deixa lá fora as emoções negativas que impedem que teu corpo receba e distribua ao paciente a energia luminosa que cura. Não te compares com qualquer irmão para que não te sintas superior ou melindrado. Não fale… Sussurre apenas. Pise como se estivesses a flutuar. Teus olhos devem falar mais que tua boca. Lembres que os anjos que fazem sentinela na “Operacional” não estão acostumados com a palavra grosseira e nem com o veneno da raiva, da inveja e da mágoa. Higieniza o vaso de teu coração para que dele transborde só os eflúvios destilados pelo amor. Esqueça de tua pessoa e fixe tua atenção no corpo do filho de Deus que está deitado na maca e que busca a cura. Que teus olhos exerçam as funções do bisturi, extirpando com doçura as dores do órgão afetado. Derrama sobre o paciente o linimento extraído do amor segregado por teu coração. Acompanhe a mão do médium que segura o bisturi afiado, e saiba que, quem o segura, na realidade é minha própria mão que ainda conserva as cicatrizes deixadas pelas cortantes folhas no distante canavial. As cicatrizes da alma? Ah! Ferimentos do passado que foram cicatrizados quando passei a trabalhar por amor na cura das almas de meus tutelados.
Com amor,
Irmão Savas
(Mentor do Núcleo Espírita Nosso Lar)